Archive for the ‘General’ Category

Certificado verde

Saturday, September 4th, 2021

 

 

Num texto anterior, evidenciámos a injusta discriminação de uma classe de cidadãos excluídos da vida social normal que se seguiu à introdução do chamado green pass. Esta discriminação é uma consequência necessária e calculada, mas não o objetivo principal da introdução do passaporte verde, que se destina não aos cidadãos excluídos, mas a toda a população que o possui. O objectivo que os governos procuram através dele é, na verdade, um controlo meticuloso e incondicional sobre qualquer movimento dos cidadãos, completamente análogo ao passaporte interno que no regime soviético todos deveriam ter para se deslocar de uma cidade para outra. Neste caso, porém, o controlo é ainda mais absoluto, pois diz respeito a qualquer movimento do cidadão, que terá que mostrar o passe verde a cada movimento, até mesmo para ir ao cinema, assistir a um concerto ou se sentar num restaurante. O cidadão não inscrito será, paradoxalmente, mais livre do que aquele que dispõe do passe e a massa de inscritos deverá protestar, já que daqui para a frente será registada, fiscalizada e controlada de forma inédita até nos regimes mais totalitários. É significativo que a China tenha anunciado que manterá os seus sistemas de vigilância e controlo mesmo após o fim da pandemia. Como deveria ser evidente, no green pass não é a saúde que está em questão, mas o controlo populacional e, mais cedo ou mais tarde, até os inscritos terão a oportunidade de o entender com as devidas consequências.

 

 

19 de Julho de 2021

Giorgio Agamben

Tuesday, November 17th, 2020

 

 

 

Aqueles que acreditam que os cristãos se conseguirão adaptar mais cedo ou mais tarde ao mundo moderno ignoram um facto avassalador para o espírito: o mundo moderno é essencialmente um mundo sem liberdade. Não há espaço para liberdade na gigantesca fábrica mecânica que deveria ser regulada como um relógio. Para ficar convencido disto, basta considerar a experiência da guerra.

A liberdade é um luxo que uma comunidade não pode pagar quando se propõe a comprometer todos os seus recursos para obter o máximo retorno. Uma colectividade livre, no mundo moderno, está em estado de inferioridade em relação a outra, e essa inferioridade é tanto mais séria quanto mais livre a comunidade. Imagine-se que, em vez de produzir máquinas em números surpreendentes, o mundo moderno se voltava para obras de arte desinteressadas, para a projecção de cidades harmoniosas, para a construção de palácios e catedrais.. seria, pelo contrário, indispensável formar um tipo de homem livre … O mundo moderno não reconhece outra regra senão a eficiência.

É por esta razão que as próprias democracias têm apanhado o seu material humano na teia de uma fiscalidade impiedosa. Em nome dessa fiscalidade, vão fortalecendo hipocritamente o poder do Estado a cada dia. Os ditadores receberam a liberdade dos cidadãos ou, se necessário, tomaram-na à força. A atitude das democracias faz lembrar a do usurário judeu que, na velha Rússia, sendo também o dono de taberna, fazia o mujique assinar, a cada embriaguez, um pequeno reconhecimento de dívida, com juros. Um belo dia, o mujique soube que as suas terras, o seu gado, a sua casa e até mesmo o touloup de pele de carneiro que trazia às costas pertenciam ao seu benfeitor. O equivalente à embriaguez, para o cidadão das democracias, é a guerra. A cada guerra pela liberdade, levam-nos 25% das liberdades que restavam. Quando as democracias decidirem fazer a liberdade realmente triunfar no mundo, pergunto-me o que vai sobrar dela para nós…

A civilização das máquinas não poderia ser concebida sem um material humano sempre disponível. O problema da justiça social está intimamente ligado ao da constituição do material humano; é por isso que as democracias, como os ditadores, estão tão interessadas nele. O material humano deve ser mantido de forma adequada, assim como qualquer material, mas a liberdade, longe de favorecer o seu desempenho, apenas o diminuiria em quantidade e em qualidade.

Liberdade para quê? A quem poderá ela servir no mundo das máquinas? Além disso, apenas se poderá tornar mais e mais perigosa. À medida que as máquinas se multiplicam e aumentam desmedidamente a sua força, a mínima sabotagem pode ter consequências incalculáveis. No dia em que um novo milagre da tecnologia permitir a qualquer físico fabricar no seu laboratório alguns materiais facilmente desintegráveis, colocando assim a destruição de uma cidade inteira à mercê do primeiro que chegar, penso que os efectivos da polícia incluirão nove décimos da população, e que um cidadão não poderá mais atravessar a rua de um passeio para outro sem baixar duas vezes as calças à frente de um guarda ansioso para garantir que ele não leva consigo nenhum miligrama da preciosa matéria.

[…]

Se me perguntarem qual é o sintoma mais geral desta anemia do espírito, certamente responderei: a indiferença à verdade e à mentira. Nos nossos dias, a propaganda prova o que quer, e aceitamos mais ou menos passivamente o que ela oferece. Oh! Sem dúvida, esta indiferença esconde antes um cansaço, e como um nojo da faculdade de julgar. Mas a faculdade de julgamento não pode ser exercida sem um certo compromisso interior. Quem julga compromete-se. O homem moderno não se compromete mais, porque não tem mais nada a comprometer. Chamado para o lado verdadeiro ou falso, mau ou bom, o homem cristão comprometia ao mesmo tempo a sua alma, isto é, arriscava a sua salvação. A crença metafísica era para ele uma fonte inesgotável de energia. O homem moderno é sempre capaz de julgar, porque é sempre capaz de raciocinar. Mas a sua faculdade de julgar não funciona mais do que um motor sem combustível. Não falta nenhuma peça ao motor. Mas não há gasolina no tanque.

Para muitas pessoas, esta indiferença à verdade e à mentira parece mais cómica do que trágica. Quanto a mim, considero-a trágica. Ela implica uma terrível disponibilidade não apenas do espírito, mas da pessoa inteira, e até mesmo da pessoa física. Qualquer um que esteja indiferentemente aberto tanto ao verdadeiro como ao falso está pronto para qualquer tirania.

 

 

 

 

excerto de La liberté pour quoi faire ?

Essais et écrits de combat

 

Georges Bernanos

 

 

 

 

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Uma década em cem filmes

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